sexta-feira, 17 de março de 2023

Você gosta de motos? Eu gosto de motos!

 Já tentei participar de alguns concursos literários no passado.

Não ganhei nenhum. Por isso, vou jogar alguns textos aqui, em uma espécie de necromancia digital:

O texto é de 2021 e, como não foi selecionado, não infringe nenhuma lei de direito de reprodução. E é meu, ergo, faço o que quiser com ele : D

 

  1. Motos = Cavalos de ferro


Motocicletas. Ciclomotores. Motos.

Do que elas te lembram? Provavelmente do espírito de aventura. Liberdade. Vento no rosto.


Cavalos. 

É isso o que vou gravar na sua cabeça. Motos são cavalos de ferro, como canta Lemmy no Motörhead. (É outra coisa que nos lembra de motos). 

Seria uma associação óbvia, se pensarmos em carros como carruagens puxadas por cavalos. Só que a medida de cavalos de potência deixa a metáfora confusa. Afinal, a moto é um cavalo de ferro com muitos cavalos de potência.


Extra! Extra! Porsche é visto sendo guinchado por 600 Vespas.


Confesso: nunca andei de cavalo. Tive uma chance quando era pequeno, mas me borrei de medo e chorei só de olhar pro bicho. Curioso que eu pense em motos como cavalos. E acredite, eu também me borrei quando pilotei uma moto pela primeira vez. Eu não sabia andar de bicicleta. Tinha 21 na época.

Sim, existem pessoas que tiveram que aprender a andar de moto para aprenderem a andar de bicicleta. Meu pai teve que segurar a bike com um marmanjo em cima. Ainda tenho a foto.


Se pensam que eu não tive infância, vocês estão errados. Mas eu não conseguia andar com rodinhas. Eu caia com elas. Porque eu não conseguia nem subir na bicicleta. Falaremos sobre os tombos mais tarde. 


Não andei de cavalo porque tinha que subir nele, para começar. As outras crianças se acostumaram rápido, mas nascer na cidade não me trouxe esse benefício. Então, aprender a andar de moto foi aprender a subir nela. Na autoescola, foi relativamente fácil. Partida elétrica. Instrutores. Mas a minha primeira moto (e atual também) é uma Honda CG 2004. Vermelha. Minha mulher o batizou de Juca. [não é mais a atual, eu consegui uma CG 2008 com partida elétrica]


Eu e o Juca vamos lhe contar histórias de aventura, liberdade e claro, rock’n’roll.

[fazia parte da temática do concurso, mas esse trecho ficou horrível] 


  1. Qual é a sua moto dos sonhos?


Gritem bem alto comigo amigos: VEEEEEEESPAAAAAAAAAASSSS!

Sim, você não está imaginando coisas. Não está escrito KTM, Triumph, Harley Davidson, Kawasaki, Suzuki e nem mesmo Honda, que eu tenho. Também não são as motos de 1000cc da BMW, aquelas que a gente vê pilotadas por Power Rangers e pela galera dos tokusatsus (apesar de serem fortes candidatas e eu tenho inclusive um quadro de uma BMW K1600 verde e linda, mas deus me livre de ter que levantar aquele trambolho numa estrada). Eu também não disse nada sobre dirt bikes e motos de endurance, que estariam em segundo na minha lista. Meu coração só bate forte quando eu vejo aquela lambreta amarelo mostarda de 9 BHP que eu nunca vou ter. A lendária Vespa. Farol com grade, aquela chapa de metal para proteger as pernas do vento enquanto você se racha de rir ouvindo Funiculi Funicula e fingindo ser o homem-aranha. Rodinhas do tamanho de uma bicicleta. 

Sim, parece ridículo. Mas eu trocaria qualquer outra por uma dessas.

[Nada a declarar, Vespas são fodas] 


Assim como qualquer outra área na minha vida, tudo ao meu redor grita e berra e quer rasgar e furar e matar e foder e ser o maior, melhor, mais rápido, mais pirocudo e ter mais dinheiro, etc. Tudo isso parece fascinante e eu também tenho ego trips fantásticas. Inclusive, já cortei giro com o Juca no trânsito e já quis arrancar retrovisores alheios. Mas tudo isso serve apenas para criar uma imagem ilusória de macho alfa. Aliviar o estresse que essa ânsia por imediatismo nos traz. Que, inclusive, é outra bobagem completa.

[Eu sou Nostradamus também, haha] 


Ter uma motocicleta é não seguir o que a sociedade te impõe e poder dizer com orgulho que eu não preciso de mais de duas rodas. Claro que, sendo casado, eu poderia usar um porta-malas. Ainda mais pra ir no mercado. Mas eu tenho o prazer de, por enquanto, me ver livre das amarras do popular e do descolado e do padrão. Eu tenho uma moto carburada de 150cc, velha, que não passa de 100 KM/h (no máximo 110 na descida, e se for subida, só chega a 80). Partida manual, que inclusive deixa marcas na canela e dói pra carai no frio. Recomendo.

[Tinha, apesar de que a atual não é muito diferente nas limitações] 


Afinal, eu quero ir devagar. A beleza da motocicleta é poder ver a paisagem enquanto ela desliza suavemente pelo asfalto (ou terra, mas vamos com calma). É ver por onde você está passando e inclusive pôr os pés no chão se quiser. Sentir o cheiro da grama, olhar os animais nos olhos enquanto passa. Ver o couro do assento e o tanque de combustível entre as pernas e sentir o motor vibrar.


Tenta fazer isso a 150 por hora. Melhor, não tente. Não vou me responsabilizar pela conta depois.


Mas eu aprecio as outras marcas. Principalmente na arte. A potência é, sim, atraente. Antes mesmo de andar de moto (considerando que é uma parcela relativamente nova na minha vida), eu já tive contato com o imaginário em torno dos cavalos de ferro.


Eu joguei todos os jogos de moto que você pode pensar. Excitebike, A série de Motocross da EA, Road Rash (do 1 ao 3D), ATV vs MX (quase todos da série), MotoGP, PURE, Motorstorm, Nail’d, FUEL e eu podia estender essa lista, mas ainda tenho outras categorias. Incluiria o pinball da Harley Davidson. Por enquanto, quero falar sobre os filmes.

[Tem vídeo do pinball da Harley no Youtube. Vá vê-lo!



  1. Eu e Max em Louco Sobre Duas Rodas


Tem uma tendência em todos esses textos e, se você ainda não percebeu, eu vou te ajudar: eu não deveria andar de moto. Parece errado. Mesmo que tenham me colocado em cima de uma quando eu era só um bebê. Profético, na minha opinião. Mas não muda o fato de que motos não foram feitas para mim. Eu nem jaqueta de couro tenho. Então, por que eu me vi montado em uma? Promoção de carta A/B. 100 reais de diferença. E a necessidade de fazer dinheiro.


Tirar a carta foi só o primeiro passo numa longa jornada de autoconhecimento e acidentes bizarros. A moto que eu tenho me foi emprestada, pouco tempo após tirar minha habilitação.

A proposta? Moto Táxi.


Se você recorda, eu gosto de ir devagar. Sou um cara tranquilo e, naquela época, mal havia aprendido a andar de moto (e bicicleta). Resultado: Pude reviver um dos momentos mais fantásticos do cinema. Eu me tornei o Mad Max, só que bem mais MAD que ele.

[Esse trocadalho foi do carilho, mêo!] 


Filmes com veículos sempre foram os meus favoritos. Road trips à la American Pie (Caindo na estrada e Madrugada muito louca), porque eu já fui adolescente. Road trips sérias (Wristcutters e o Fear and Loathing in Las Vegas ), porque eu sou um cara cult. Mas os melhores são os em que eles explodem. E Mad Max são duas horas de demolição veicular, por filme.

[Battletruck é outro clássico cult de filmes com combate veicular. Recomendo.] 


Se você achou que minha moto ia explodir, desculpe. Pode pegar seu dinheiro de volta.

Se você achou que eu me envolvi numa fuga alucinada com a polícia, você quase acertou.


Teria acertado se tivesse acrescentado com chuva e passageiro. Numa rodovia. Com menos de 3 meses de habilitação. Mas o mais engraçado é que eu só percebi o que havia acontecido quando estava deitado na grama.


Vamos reconstruir a cena, começando pelo contexto:


Um conhecido meu, que vou chamá-lo de Max para combinar com o título, foi o meu tutor depois que me foi concedida a permissão de circular em vias públicas com máquinas automotoras. Erro deles, claro. Mas eu fiz todo o processo legal sem nenhuma falta.

Ele fazia bicos como mototaxista também e, como ele tinha muitos pedidos e eu estava desempregado, teve a ideia de me guiar no ramo. Já adianto que não deu muito certo.


Querendo saber se eu estava pronto para carregar pessoas, ele se voluntariou para ser meu passageiro. Agora, quando eu digo Max, você deve imaginar o Mel Gibson. Vamos desassociar essa imagem por um instante. Quando eu escrever Max a partir de agora, eu quero que vocês pensem no cara mais corpulento que vocês conhecem. O maior. Não tem problema se exagerarem, porque no momento em que ele subiu na moto, eu quase fui pro chão com tudo.


Recomposto (quase), ele pede para que eu guie sem rumo, para que ele avaliasse minha capacidade. Foi me dando algumas dicas no caminho, desde o básico “não caia” até como trocar de marcha sem usar a embreagem (na época eu não aprendi nenhum deles).

 


Eu não terminei a porra do texto, cara!

Que vacilo!

Proposta: Vou terminar e colocar o resto aqui embaixo.

Quando? Provavelmente hoje ou amanhã.

E o melhor? Ao vivo!

Estão todos convidados. Formalmente...

 [Atualizado no dia 18/03/2023]

Seguindo a estrada, na época eu utilizava um capacete aberto (emprestado também, então ele era um pouco largo) e não tinha roupas adequadas para o motociclismo (e ainda não tenho, na verdade). Parece irrelevante, mas 10 minutos depois que começamos nossa jornada na pista, começa a chover.

Indagado se deveríamos voltar, nosso amigo Max diz apenas "Você vai ter que se acostumar com isso" e então continuamos na estrada na qual eu caí aleatoriamente (e que saía da cidade em que estávamos). Portanto, eu estava de camisa, capacete aberto e um cara enorme na garupa enquanto era bombardeado pela mais dolorosa torrente de outono.

Completamente distraído, mal sabia eu que atrás de mim havia se iniciado uma perseguição policial. O alvo? A minha própria pessoa. Agora, eu já estava ocupado com o trabalho de guiar meu novo cavalo de metal pelo asfalto molhado, enquanto caia água na minha cara, e não derrubar o meu amigo (e não cair também). Então, eu não percebi os poucos momentos em que Max me pediu para reduzir ou ir para o acostamento.

Como ele é o Mad Max, a paciência não é a sua principal característica. Logo, ele simplesmente assumiu a direção, não sem pedir licença (que no caso foi: "Encosta! Encosta!") e então, como ele provavelmente não ia conseguir fazer a moto parar, ele nos guiou gentilmente até o gramado do acostamento.

Vocês podem imaginar o quão chocado eu estava por ter deslizado na grama com tanta graça e nem ter me machucado (sério, foi o pouso da águia), apesar de ter ficado com um pouco de terra. Naquele momento, ainda deitados, Max de súbito levanta a mão e diz "Eae, beleza?" para uma viatura policial que passou direto por nós.

Sem entender nada (até hoje, inclusive), ele apenas me diz que estavam nos seguindo há alguns minutos e haviam sinalizado para nós pararmos. Não sei se foi a inexperiência, a inocência (ingenuidade) ou se realmente era coisa da cabeça dele e não minha, visto que ele, na verdade, conhecia os policiais, mas eu não havia percebido em nenhum momento que eles estavam lá, menos ainda o (micro)sinal de que eu deveria parar.

Depois de levantarmos, eu simplesmente fiz o retorno e fui de volta para casa, porque o caminho que eu havia pegado ia me levar para outra cidade e eu já havia consumido uma dose cavalar de aventura naquele dia. Em resumo, eu estava cansado demais para aquela merda.


IV.                            Os animais na pista (ou, quem é mesmo a anta?)

     Depois dessa training sequence que daria inveja ao treinador do Rocky Balboa, vários outros eventos menores aconteceram para selarem minha reputação como o pior moto taxista da cidade em que eu moro. Na lista, temos: derrubar a sua primeira cliente; dirigir tão devagar que o seu garupa te pede várias vezes que "você pode ir mais rápido"; a única ligação que fizeram me pedindo carona foi a mais constrangedora, pois eu não sabia o nome das ruas da cidade, a cliente estava com pressa e então eu encerrei a ligação com a pérola "Eu sou mototaxista pra quem não tem pressa. Se estiver com pressa, é mais rápido ligar para outro".

Assim, a minha carteira de clientes consistia em uma única senhora para a qual eu fazia todas as compras. Acreditem se quiser, acabou sendo lucrativo demais e fez com que eu me virasse por vários meses até encontrar outro trabalho (demorou 1 ano e meio, aproximadamente). Minha mulher ainda desconfia que, na verdade, ela gostava de mim, mas eu não quero pensar por esse lado.

Porém, alguns meses depois da minha primeira experiência levando alguém na garupa (com o nosso amigo Max ali em cima), eu já estava um pouco mais confiante na minha habilidade de direção e, podia dizer, com um orgulho idiota, andava bem de bicicleta. E eu me divertia bastante, tanto que eu diariamente pedalava uns 5 km (dando 10 voltas) na pista em um parque próximo de casa (eu ainda faço esse percurso, mas com menos frequência).

E, naquela época, meu cunhado estava fazendo a sua festa de aniversário em um local remoto em outra cidade. Ele, minha sogra e minha cunhada iriam de carro, levando as coisas para a festa, e eu, o felizardo, iria de moto com a minha mulher (na época ainda minha namorada). O caminho era relativamente simples, como todas as outras rotas aqui do interior de São Paulo.

Mas, uma única placa me daria o presságio do que aconteceria mais tarde naquela mesma viagem.

Não é a mesma placa, a atmosfera era menos sinistra, pois o céu estava azul e o sol iluminava a grama e vegetação nas beiradas da estrada. Era um dia lindo.

PARA MORRER!

Quando estávamos próximos do nosso destino, eis que um novo personagem se apresenta para nós de uma maneira inusitada. Uma Anta, Tapirus Terrestris, simplesmente surge no horizonte e começa a atravessar a estrada. Porém, ao invés de fazê-lo em linha reta, ela decide, seguindo a sua própria lógica, vir na minha direção.

Eu já estava me imaginando atingindo-a e sendo arremessado em câmera lenta para o oblívio (não sem antes quebrar o pescoço e perder os sapatos), mas o instinto de sobrevivência também quis se manifestar e, enquanto eu reduzia a velocidade, comecei a sair da trajetória da anta. Ela continuou se aproximando. Eu já estava na contramão quando ela acabou passando do nosso lado.

Ela bateu suavemente o traseiro na roda (também traseira) da moto. Naquela altura, eu metaforicamente havia cagado nas calças. A moto balançou suavemente (demais, inclusive, mas talvez tenha sido a adrenalina e a tensão que a manteve no lugar — além da força centrípeta) e então eu vi a anta pelo retrovisor retornar ao éter floral do qual ela surgiu.

E eu, depois de voltar para a minha faixa (não sem antes vislumbrar como seria o meu fim, pois havia um ônibus que logo passaria do meu lado), começaram as tremedeiras. Minhas pernas falharam e foi muito difícil pilotar até o local da festa.

Porém, apesar desse contratempo, chegamos em segurança ao nosso destino.

Admito que a volta foi ainda mais sinistra para mim, pois foi durante a noite. Mas, não houve nenhum acontecimento extraordinário depois disso e eu estava são e salvo em casa, entupido de comida e ainda com as pernas moles. Por muito tempo eu sonhei com aquele momento e até hoje eu fico com medo das placas de animais na pista.


V.                            As rodas da fortuna (e os outros eixos da vida)

    E então, todos esses relatos de 2016 servem para elucidar como foram meus primeiros momentos com essa bomba relógio que a humanidade insiste em usar como meio de locomoção. Pelo objetivo de ser breve, com certeza eu pulei várias outras histórias emocionantes de encontros com outros veículos, caminhões querendo me ultrapassar na pista, as quedas variadas (inclusive, cair com a moto parada e ela não ligar depois) e todas às vezes em que eu fiz motocross para visitar meus pais.

Motos são maravilhosas e, apesar de estar na procura de um carro (porque, como diz o ditado, para quem anda de moto: "Furou o pneu ou choveu, fudeu!"), são esses e outros momentos que fazem com que eu ainda continue a arriscar o pescoço todos os dias com esses torpedos terrestres.

O Juca, nossa primeira moto, acabou sendo substituído por seu irmão mais novo (que era do meu irmão mais novo), o Batman (porque ela é preta). Não houve tantas aventuras emocionantes também, porque além de eu já ter um certo tempo de direção (7 anos) eu já não piloto mais com tanta frequência.

Sendo assim, ficam apenas as recomendações de que se tomem cuidado nas pistas e estradas, não só para os motociclistas, inclusive. E aquela conversa de não beber enquanto dirige, não usar o celular e, principalmente, tomar um cuidado especial com as antas da estrada.

E eu não estou falando dos animais...

 

 

sexta-feira, 26 de agosto de 2022

Sim, eu estou vivo

  

            Já faz um bom tempo que não escrevo aqui.

Muita coisa se passou desde a última postagem e, mesmo que ninguém se importe com esse blog (ou comigo), vou relatar aqui as mudanças ocorridas nestes últimos 7 ou 8 anos em que ele ficou parado.

  1. Eu me casei há dois anos e meio.
  2. Estou morando sozinho desde 2016, com seus altos e baixos, mas posso dizer que as coisas estão bem atualmente.
  3. Já apareci na TV 2 vezes, mas não por mérito próprio.
  4. Ainda não escrevi nenhum livro, nem me formei em alguma faculdade. Pretendo mudar isso, eventualmente.
  5. Ainda faço música eletrônica, mas não tenho novidades nesse campo.
  6. Apesar de não ter escrito nenhum livro, tenho textos rolando por aí.
  7. Tenho um canal no YouTube e no Twitch, mas não espere nada extraordinário lá.
  8. Sigo com a mesma vida e, para quem me conhece, sabe que isso significa muito tempo em frente a livros ou eletrônicos e pouco tempo fora de casa. E isso é muito bom.

 

Vou encerrar a lista por aqui mesmo. A outra novidade e o motivo pelo qual eu dei uma reanimada aqui (além de jogar todos os links e me gabar um pouco) é a revista que eu fiz com o meu irmão esses dias. O link está lá embaixo, para quem estiver interessado.

Já peço desculpas de antemão por qualquer controvérsia que pode surgir de qualquer material aqui postado. Aviso que não há decepções além da qualidade ruim e do amadorismo, porém, se eu não fizer, ninguém vai.

Fiquem com Deus e até outra hora. (Sim, o número 9 é não ser mais ateu).

Durmam com essa.

 

A revista em questão

terça-feira, 3 de fevereiro de 2015

Memórias de Pedro e um tributo aos que não puderam nascer



A morte. O pequeno momento que todos esperam, mas ninguém deseja. Não se poupam esforços para evitá-la. Terapias, remédios, implantes. Tudo o que a ciência fabrica pode ser utilizado na eterna luta contra o absoluto. Mas é a única constante deste universo caótico e a certeza para tudo aquilo que existe. Um fim.

            Enquanto a vida é linear, ordenada por começo, meio e fim, assim como tudo que fazemos, aqui será diferente.

            Este trabalho foi dedicado àqueles que não puderam ver o início de sua jornada, sendo atirados para o esquecimento antes mesmo de deixarem o seu legado. Seja por complicações médicas, tentativas de aborto por parte de suas mães ou pelo também conhecido aborto espontâneo, que tiraram-lhes a oportunidade de moldarem o mundo com suas histórias, atos e intervenções.

            Nós, o autor, em conjunto da minha cobaia Nº 2, Matheus Martins, possuímos duas peculiaridades que eu desejo ter como abertura deste perfil. Não é a história mais agradável, visto que até hoje não temos muitas, mas é algo em que temos orgulho de passar para vocês por intermédio deste texto.

            Matheus Martins, quando nasceu, teve o cordão umbilical enrolado no pescoço, formando uma simbólica forca que demonstrou exatamente qual era o seu desejo no dia de seu nascimento. Enquanto à mim, devido a paciência com que fui dotado pelos meus antepassados por meio do código genético, fui paciente em esperar 10 meses para vir ao mundo. Meu nascimento só foi possível por intervenção médica.

            Se pensarmos a respeito, essa trivialidade não revela menos que uma estatística e não acrescentaria em nada ao mundo, pois não se trata de algo extraordinário, importante ou decisivo para a humanidade. Seria, no máximo, uma anedota bizarra para contar aos amigos.

            Porém, toda existência é efêmera do ponto de vista histórico, mas cada ser fez do nosso mundo o que ele é hoje e cada vida perdida (ou, cada nascimento interrompido) nos tiram possibilidades que seriam únicas. E aqui entra o segundo relato.

            Nós tivemos a sorte de sobreviver e compartilharmos estes casos, porém, não diríamos o mesmo dos dois indivíduos a seguir:
            Maila, ou May, cuja data de nascimento não é lembrada pelo irmão, não teve a chance de participar do constante processo de construção do mundo, porque não se sabe de alguém que tenha sobrevivido a um aborto espontâneo. Mas o interessante nesse caso é a teoria que Matheus formulou, baseado em observações e lembranças de sua infância.

            Apesar de nebulosas e confusas, recorda que visitou um orfanato (mesmo que dentro do carro, enquanto seus pais iam e voltavam) durante um longo período e sempre se lembrava de sua mãe chorando quando saía, o que o levou a crer que sua irmã teria sobrevivido, mas que por alguma complicação desconhecida, não pôde viver junto a eles. Isso se tornou sua motivação pessoal e disse que investirá na busca pela verdade sobre sua irmã no futuro.

            Quanto a mim, não tenho uma teoria ou história interessante sobre meu irmão (que seria o médio, sendo eu o primogênito) e a única imagem que tenho dele é a de um frasco de vidro com um líquido rosado onde ele está flutuando e prefiro acreditar que é apenas o meu cérebro sendo inconveniente. Eu só tinha 4 anos na época, então até eu duvido que teria sido ele. Ele não completou 4 meses e ainda não sabiam qual seria seu nome, mas seu legado é, por mim, aqui deixado.

            Quando falamos em nomes, Matheus olha torto e sabe que eu vou comentar sobre seus apelidos. Na verdade, o correto é a sua condecoração e o nome que ele mais odeia.
            Vamos pelo mais antigo, o nome que, quando é usado para se dirigir a ele, faz com que ele exploda de raiva. É um nome comum, Pedro.

            “Não me chama de Pedro!”, ele responderia se estivesse aqui. Eu poderia dizer que, quando ele era pequeno, as pessoas costumavam chamá-lo de Pedro porque diziam estas que esse parecia ser o nome dele. Essa é uma versão da história. E é a mais chata também. Sem falar que acontece até hoje, sendo a última na quinta-feira passada (14/11/2013), por sua professora de algoritmo.

            A versão boa (ou trash, sendo o motivo visível daqui a pouco) é em 2001, quando ele ainda estava em Maringá, cidade localizada no Paraná, na 1ª série do fundamental. Havia um garoto chamado Pedro, que possuía ossos-de-vidro (de acordo com Matheus, não sabendo se ele realmente sofria de osteoporose ou alguma outra doença relacionada aos ossos) e que sempre se aproveitava disso para provocar os outros e sair impune.

            Mas um dia, Pedro empurrou Matheus e ele, como toda criança da década de 90, empurrou ele de volta, fazendo-o cair e quebrar os dois braços, formando uma pose horrível, com os braços deslocados para trás. A partir daquele dia, todos o chamaram de Pedro. Apesar do incidente, Matheus não possuía nada contra Pedro, exceto a raiva pelo nome.

            Já a condecoração tem um teor cômico e foi dada a ele em 2009 por seu antigo professor de história na 8ª série, 2 dias após conhecê-lo. Apresento-lhes minha cobaia Nº1, Thiago Bosquê, também conhecido como Café.

            Nº 1 porque ele seria o alvo para o perfil. Mas até mesmo nosso mestre com problemas de fidelidade possuía suas fraquezas. Entre elas, não queria ser identificado. Não deixou que usassem as partes interessantes na biografia. E foto? Eu vi que pedir uma seria por um fim (abortar?) a entrevista que mal começou. É claro que, com o decorrer da entrevista, ele se sentiu como quem sai de uma seção de descarrego e chegou a quase chorar, mas o máximo que saiu daí foi um “porque é muito legal isso que você está fazendo” e a permissão para usar o nome. Mas…     

Continuando com a condecoração, ela foi concedida a Matheus após uma piada feita a respeito de sua vida e da sua situação após uma briga (ou guerra) com seu antigo grupo de entretenimento, o DecalcoMania. Da piada, não se lembra com exatidão, mas “era algo sobre eu ser adotado e Trezy, minha gata, ir embora também”. Eu não tive permissão para reconstituí-la, então esta pérola está perdida nos confins do espaço-tempo.

            Mas, de acordo com Café, ela foi tão boa e, ao mesmo tempo, mostrava que nosso amigo estava tão “na merda” que ele disse: "Nossa, mas você é um fracassado. E o pior é que você ainda nos faz rir com a sua desgraça. Você é como um lorde. Sir Loser."

Este título foi o primeiro passo na criação do Matheus que conhecemos hoje, o humor negro lhe caiu como uma luva e referências sobre o nazismo (e uma foto dele com o bigode, mas que não pude trazer) lhe renderam o apelido de Nazi.

Apesar de termos mostrado só uma pequena parte do sofrimento de Matheus, não podemos esquecer das coisas boas. Ou, para ser mais específico, Black Sabbath.
O dia 11 de outubro (de 2013) foi a razão de Matheus, nosso anti-herói, ainda não ter terminado a vida à la Cobain e o dia em si se mostrou o ponto mais promissor de redenção que sua vida pôde encontrar. (Até agora...)

Do que ele mais se orgulha é de como conseguiu a camiseta que ele usa na foto (não tenho mais...). Ela não é só uma vestimenta, mas um troféu em homenagem ao seu sofrimento e ao seu grande dia, “como um pedido de desculpas do mundo por tudo o que me fez passar”. Esta pode ser uma das maneiras de contá-la:

Matheus e seu meio-irmão, Guilherme, no caminho para o show do Sabbath, são abordados por um serelepe vendedor que ofereceu-lhes uma camiseta da banda por 35 reais. Ele, como todo brasileiro, já barganhou com o comerciante para pegar 2 por 50 e, com o mesmo aceitando a proposta, vestiu a sua camisa, como uma criança que abre o doce assim que ganha.

Percebendo, porém, que a sua camisa não possuía o desejado “Eu fui”, ficou pensando em alguma maneira de trocá-la. Tentou vender de volta, mas pela inexistente possibilidade de obter o retorno ou a camiseta que queria, abandonou a ideia. E acabou optando pelo imprevisível.

Ele entrou em uma barraca de camisetas e perguntou se poderia trocar a dele por uma que confirmasse a sua presença no show. E como se o destino sorrisse para eles (talvez como desculpas pelas inúmeras ofensas), eles conseguiram o que pediram sem mesmo precisar apresentar um comprovante de que a compra foi feita ali.

A hora de entrar no Campo de Marte foi outra demonstração de sorte e genialidade, porque eles não pegaram fila apenas por seguir reto, sem rumo e como quem não quer nada em busca da mesma. Quando eles chegaram perto das catracas, uma vasta multidão surge de portões atrás deles e, discretamente, eles se misturam e desfrutam da sua vitória inesperada.

É claro que não foi perfeito, visto que 6 horas debaixo do sol ouvindo AC/DC, sendo amassado e de estômago cheio, não demorou para que ele esvaziasse suas entranhas antes do fim do show. E é claro, durante a entrevista, ele comentou que, se morresse agora, pelo menos ele viu o Sabbath ao vivo.

Ele estava muito perplexo pela emoção que foi estar no meio daquelas 75.000 pessoas, sendo que esperava desde o dia em que disponibilizaram os ingressos para aquele momento, e pela entrevista sobre o show ser feita três dias depois (sem falar que ele se perdeu no caminho para meu bunker e ficou muito, muito nervoso), não temos informações o suficiente para tecer (costurar, eu não uso internetês) um novo capítulo.

Sobre Matheus Martins, ele está cursando tecnólogo em Jogos Digitais, terminando seu curso técnico em Mecatrônica (onde eu também estou presente) e pretende retomar seu trabalho no Youtube e ressuscitar o DecalcoMania. Ele também ganhará uma irmã (meia-irmã) ou, como ele a chama, o “bebê-golfinho” em meados de janeiro.

Ele não está nem um pouco feliz, porque tem 18 anos e acabou de ganhar mais um motivo para sair de casa o mais cedo que puder, esperando apenas ser liberado do seu curso técnico para arrumar um emprego e começar a juntar suas economias para abandonar o ninho.

Poderia ter sido fácil terminar agora, mas eu ainda tenho mais coisas para acrescentar. Primeiro, tirar a foto desse cara foi a parte mais difícil deste trabalho. Sério, além de ter demorado até a data de entrega para estar “pronto”, ele tirou a barba ontem só para isso. Não sem antes tirar a melhor foto do mundo, mas não me deixar usá-la…

Eu tinha uma cobaia Nº3. Como não coube aqui, e eu conheci ela no ônibus no dia 14/11/2013 e ela estava tão nervosa na entrevista que eu precisei segurar a mão dela para o gravador (celular) captar a voz dela. Mas, foi divertido.

Não vou citar o nome, já que ela não estreou aqui como um possível contraponto ao meu amigo, Sir Loser (e por ela estar no conselho tutelar desde 2010 e saber onde eu moro). Sem fotos também. Mas apenas que fiquei triste por ela ter se machucado gravemente no sábado, impossibilitando-a de realizar uma ação de caridade em um orfanato para crianças que foram vítimas de aborto.

Felizmente, esta ação será adiada. (Já aconteceu, viva!)

Quanto a mim, o que resta é finalizar este perfil com a seguinte frase, que resumiria tudo o que foi dito nessas "páginas":
“…Antes fracassar do que desistir. E se for para fracassar, que seja fazendo o que gosto.”


O vídeo é em homenagem ao Café, que, assim como eu, concorda que certos covers são melhores que os originais...